Setembro |
September |
Joana Villaverde
Margarida Cardoso Moreira
The Francis Crick Institute, Londres
Como é ser uma cientista?
Tell us about your experience as woman and scientist. Sempre sonhei em tornar-me uma cientista. Fazer ciência não me parecia um emprego, mas uma forma de vida. O que podia ser mais excitante e enriquecedor do que dedicar-me a descobrir os segredos da vida? Vinte anos passados, posso dizer-vos que a realidade de ser cientista não desapontou, muito pelo contrário! Tal como tinha antecipado, é realmente excecional dedicar os meus dias a tentar resolver os enigmas da natureza. O que eu não sabia quando tinha a vossa idade, é que esta carreira me iria levar a trabalhar em dois continentes, cinco países, e a colaborar com cientistas em todo o mundo (e a aventura continua!). Ao contrário da maioria das atividades humanas, a ciência não tem fronteiras. E talvez contrariamente àquilo que possam pensar, não há um ideal de cientista ou modo de fazer ou estar em ciência. Durante grande parte da nossa história, fazer ciência era de facto, um privilégio reservado a uma minoria. Mas não agora. Agora somos muitos e muito diferentes, com estilos, personalidades e culturas distintas. Na ciência há espaço para todos (e todas) nós. Eu trabalho no Instituto Francis Crick, em Londres, onde investigo, com colegas de vários países, como é que durante a evolução são criados órgãos totalmente novos. A maioria dos nossos órgãos (como o coração, o cérebro, ou os rins) são muito antigos, mas há exceções. Sabiam que nem todos os mamíferos têm placenta? Que por exemplo, o mamífero ornitorrinco põe ovos? A placenta é uma inovação evolutiva, e é um órgão cheio de mistérios que queremos resolver. Nós estudamos vários mamíferos para perceber, por exemplo, como é que durante a gravidez o sistema imunitário da mãe tolera o contacto direto com as células do seu bebé (afinal, o nosso sistema imunitário está treinado para reagir contra a presença de outros organismos). E a placenta não é uma inovação exclusiva dos mamíferos! Placentas evoluíram de forma independente mais de 100 vezes em vertebrados. Há placentas em muitos peixes, lagartos e cobras. Isto faz da placenta um órgão excecional para estudar como é que órgãos novos aparecem durante a evolução. I always dreamed of becoming a scientist. Doing science didn't seem like a job to me, but a way of life. What could be more exciting and enriching than to devote myself to discovering the secrets of life? Twenty years later, I can tell you that the reality of being a scientist has not disappointed, quite the contrary! As I had anticipated, it is truly exceptional to devote my days to trying to solve nature's riddles. What I didn't know when I was your age, is that this career would take me to work in two continents, five countries, and to collaborate with scientists from all over the world (and the adventure continues!). Unlike most human activities, science has no borders. And perhaps contrary to what you might think, there is no ideal scientist or way of doing or being in science. For much of our history, doing science was indeed a privilege reserved for a minority. But not now. Now we are many and very different, with distinct styles, personalities, and cultures. In science, we all fit. I work at the Francis Crick Institute in London, where I investigate how, during evolution, entirely new organs are created. Most of our organs (like the heart, the brain, or the kidneys) are very old, but there are exceptions. Did you know that not all mammals have a placenta? That for example, the mammal platypus lays eggs? The placenta is an evolutionary innovation, and it is an organ full of mysteries that we want to solve. We study various mammals to understand, for example, how during pregnancy, the mother's immune system tolerates direct contact with the baby's cells (after all, our immune system is trained to react against other organisms). And the placenta is not an innovation unique to mammals! Placentas have evolved independently more than 100 times across vertebrates. There are placentas in many fish, lizards, and snakes. This makes the placenta an exceptional organ to study how new organs appear during evolution. |
Que outra cientista te inspirou?
Tell us about another scientist that has inspired you. Quando tinha a vossa idade estava determinada a seguir uma carreira científica, mas tive dificuldade em escolher entre a física, a cosmologia e a biologia. O que me levou a escolher a biologia, e mais tarde o estudo da evolução, foi aperceber-me que estávamos num período de revolução nestes dois domínios, uma altura de imenso progresso científico. Esta revolução começou nos anos 50 com a descoberta da estrutura do ADN e central a esta descoberta foi o trabalho da Rosalind Franklin. A Rosalind Franklin nasceu em 1920, uma altura em que era extremamente difícil para as mulheres fazerem ciência e muito poucas a faziam. Mas ela era absolutamente determinada e brilhante. E contra tudo e contra todos, fez uma série de contribuições fundamentais, não só para a estrutura do ADN mas também para o desenvolvimento de ferramentas (como a cristalografia de raios X) que hoje usamos, por exemplo, para estudar o vírus SARS-CoV-2. Hoje o trabalho dela é amplamente reconhecido, mas enquanto viva, a Rosalind Franklin encontrou imensa resistência, falta de apoio de colegas e instituições, e falta de reconhecimento. Eu aprendi sobre ela, a sua vida e ciência, através de biografias que li quando estava a começar o meu doutoramento. Achei-a absolutamente fascinante e inspiradora. Ainda hoje penso nela frequentemente, no seu amor pela ciência, na sua determinação, na sua coragem. A Rosalind Franklin morreu muito jovem, aos 37 anos, mas que vida! Uma inspiração para as sucessivas gerações de novas (e novos) cientistas. When I was your age, I was determined to pursue a scientific career, but I had difficulty choosing between physics, cosmology, and biology. What made me choose biology, and later the study of evolution, was realizing that we were in a period of revolution in these two fields, a time of immense scientific progress. This revolution began in the 1950s with the discovery of the structure of DNA, and central to this discovery was the work of Rosalind Franklin. Rosalind Franklin was born in 1920 when it was extremely difficult for women to do science, and very few did. But she was absolutely determined and brilliant. And against everything and everyone, she made several important contributions, not only to the structure of DNA but also to the development of tools (such as X-ray crystallography) that we use today, for example, to study the SARS-CoV-2 virus. Today her work is widely recognized, but while alive, Rosalind Franklin encountered immense resistance, lack of support from colleagues and institutions, and lack of recognition. I learned about her, her life and science, through biographies I read when I started my PhD. I found her utterly fascinating and inspiring. I still think of her often, her love of science, her determination, her courage. Rosalind Franklin died very young, at the age of 37, but what a life! An inspiration for successive generations of new scientists. |